Venezuela inicia investigação e deve pedir prisão de Milei e de duas de suas ministras

19 de setembro de 2024 às 08:14
Mundo

Foto: Reprodução

Folha

O chavismo aposta em um novo inimigo internacional e, nesta quarta-feira (18), anunciou que a Justiça da Venezuela vai pedir a prisão do presidente da ArgentinaJavier Milei, e de suas ministras Karina Milei (Secretaria-Geral) e Patricia Bullrich (Segurança).

O anúncio foi feito pelo procurador-geral venezuelano, Tarek William Saab, aliado próximo de Nicolás Maduro. Em um pronunciamento, ele disse que designou procuradores para investigar o que chama de roubo de um avião do país por Buenos Aires, além de graves violações de direitos humanos no governo do ultraliberal Milei.

Saab afirmou que um tribunal caraquenho deve começar a análise da matéria; a Justiça venezuelana também está dominada pelo chavismo. A medida tem pouco efeito prático, mas um lastro simbólico relevante.

O timing, porém, não é surpreendente: os anúncios chavistas ocorrem na mesma semana em que avança na Justiça da Argentina uma ação que poderia, no mesmo sentido, pedir a prisão do ditador Nicolás Maduro, de seu agora ministro do Interior e número 2 do chavismo, Diosdado Cabello, além de outras dezenas de figuras.

O argumento é que essas figuras, por meio da repressão, ergueram a pior ditadura cívico-militar da região hoje. Ex-presos políticos e ex-deputados venezuelanos asilados na Argentina têm falado a um tribunal de Buenos Aires para compor as denúncias.

Tanto a ação que se desenrola na Argentina com apoio de figuras como Patricia Bullrich quanto a que agora é sinalizada por Caracas têm como base o princípio da jurisdição universal, parte do direito internacional segundo a qual Estados e organizações podem reivindicar jurisdição criminal contra alguém independentemente de onde o crime tenha sido cometido e também da nacionalidade do acusado.

São ações, em geral, de peso argumentativo e principalmente ligadas a crimes de genocídio ou de guerra, contra a humanidade, execuções extrajudiciais, tortura ou desaparecimentos forçados, normalmente difíceis de serem avaliados de forma independente em sistemas de Justiça ligados a autocracias.

Maduro e seu regime já são alvos de uma investigação no TPI, o Tribunal Penal Internacional, baseado na holandesa Haia. A Argentina é um dos países que apoia essa investigação; o governo local havia se dissociado das acusações, mas, quando Milei assumiu a Casa Rosada, juntou-se novamente ao caso.

Tarek disse que parte da investigação contra o presidente argentino e suas ministras se deve à apreensão de um avião cargueiro venezuelano na Argentina, a pedido dos Estados Unidos, devido às sanções internacionais. O veículo foi enviado aos EUA e, segundo Caracas, completamente desmontado.

A aeronave em questão, um Boeing 747 de carga, pertencia à Emtrasur —filial da companhia aérea estatal venezuelana Conviasa— e havia sido vendida para a ditadura por uma empresa do Irã, a Mahan Air.

Em resposta, a chancelaria argentina afirmou em nota na noite desta quarta-feira que "o caso foi resolvido pelo Poder Judicial, que é independente e sob o qual o Executivo não pode nem deve ter ingerência alguma". A decisão de confiscar o avião foi de um juiz.

"O governo argentino lembra ao regime venezuelano que na Argentina impera a divisão dos Poderes e a independência dos juízes, algo que lamentavelmente não ocorre na Venezuela", conclui a nota.

Mas Tarek também entrou na política doméstica argentina e afirmou ter designado outros procuradores para investigarem potenciais violações de direitos humanos no governo Milei, que em sua narrativa poderiam constituir crimes contra a humanidade.

Mencionou especificamente a repressão contra aposentados que têm protestado contra o veto do presidente a uma recomposição do valor das aposentadorias em cenas que, no mais, também comoveram a própria Argentina nas últimas semanas.

"O senhor representa um projeto de ultradireita dos mais retrógrados da política internacional", disse o procurador-geral referindo-se a Milei. "O senhor renunciou à soberania do seu próprio país."

O governo de Javier Milei é um dos mais críticos a Nicolás Maduro na região. Na embaixada argentina em Caracas, que está atualmente sob os cuidados do Brasil após a equipe diplomática argentina ser expulsa do país, estão há meses seis asilados políticos que são membros do alto escalão da campanha de Edmundo González e María Corina Machado.