Por que começamos acelerando áudios e agora queremos acelerar as pessoas?

27 de abril de 2025 às 06:55
Brasil

Foto: Reprodução

Viva Bem

Você se lembra de quando não existia a possibilidade de acelerar conteúdos? Não faz tanto tempo assim. A gente era "obrigado" a ouvir áudios, ver filmes, assistir a séries e ouvir músicas no tempo da duração que eles tinham. Foi em 2021, durante a pandemia, que a principal empresa fornecedora de serviço de conversação instantânea lançou a ferramenta de aceleração de áudios.

Na época, lembro que escrevi um texto falando que estamos doentes de velocidade e que acelerar os áudios era um sintoma. Ouvi muito desaforo. "Que chata. Basta não acelerar o seu. É uma escolha", me diziam. Sim, parecia ser, mas queria justamente chamar atenção para o fato de que o que parecia ser uma escolha era, na verdade, uma questão social, mais ampla, coletiva. E arrisquei dizer que aquilo iria acelerar nossa experiência.

Eu pesquiso tecnologias. E nesta pesquisa fui ao longos dos anos compreendendo pelo menos duas chaves de leitura que me fazem entender que as tecnologias aceleram nossa experiência e que não paramos para pensar nisso, quando aderimos a uma nova "febre tecnológica" (isso está acontecendo com a IA: estamos adotando uma suposta "ferramenta" meio sem entender muito bem que ela não é neutra e que se não tivermos intenção nesta adoção, estamos atendendo a um mero apelo de consumo de quem está interessado em que estas coisas se popularizem: as empresas que vendem estas soluções).

Não sou contra a tecnologia. Seria ingênua se fosse. Não se trata disso. Trata-se de pensar nos efeitos que estes dispositivos produzem em nossas mentes e corpos quando normalizamos e normatizamos seus usos sem nos perguntarmos para que estamos fazendo isso.

No caso dos aceleradores de áudio, tudo começou como se fosse uma escolha mesmo. As pessoas até se perguntavam quando fazia sentido acelerar e quando não fazia. Depois, elas passaram a deixar os dispositivos em velocidade x2 como modo padrão.

Hoje, em todos os lugares por onde eu circulo em aulas, palestras e conversas, ninguém mais acha estranho que isso seja o "normal". Algo que seria uma escolha se tornou um hábito. Acontece que quando este hábito é coletivo, ele não demora muito para se tornar uma regra. Ou seja, além de normalizado (virou normal), está normatizado (virou norma). E quando vira norma, exclui quem não acelera e fica pra trás.

Os pretextos são ótimos. "Acelere para liberar tempo para o que importa". Quando, na verdade, sabemos que estamos liberando tempo para produzir mais, trabalhar mais, entregar mais, consumir mais e ficar mais tempo rolando o feed.

Mas não fica por aí. Além de comprimir o tempo e acelerar os conteúdos, esta escolha (que vira hábito que vira regra que vira violência quando exclui quem fica pra trás) age em nossas mentes, gerando uma irritação com ritmos humanos.

Quem nunca ficou impaciente diante daquela pessoa que começa a contar lentamente uma história que parece sem fim? Ou ficou irritado por achar a pessoa devagar demais? Ou ainda se pegou falando "pode contar, que estou te ouvindo" enquanto mexia no celular, por que não deu conta de sustentar a atenção ao ritmo do outro?

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As tecnologias não são apenas recursos "técnicos". Elas carregam consigo uma cultura, um modo de viver, sistemas de pensamento. Estão, de alguma forma, banhadas em valores sobre os quais não temos pensado muito bem ao fazer nossas escolhas. E estes valores vão, de forma sutil, moldando nossas formas de viver e nos relacionar.

Quando aceleramos áudios e depois isso acelera nosso modo de nos relacionarmos com os outros, isso fica muito evidente.

O sociólogo alemão Hartmut Rosa, autor de "Aceleração: a transformação das estruturas temporais na modernidade" afirma que a aceleração é técnica, do ritmo de vida e das transformações sociais.

Basicamente, ele chama atenção para o fato de que ao longo do tempo temos realizado tarefas em menos tempo. Coisas que levavam séculos estão levando décadas. Coisas que levavam décadas, estão levando anos. Coisas que demandavam anos estão acontecendo em meses ou dias. Portanto, essa aceleração não é apenas uma percepção ou uma sensação. O que experimentamos no corpo é, de fato, a aceleração social do tempo.

E quando aceleramos áudios, séries, músicas ou vídeos, estamos dando nosso quinhão de contribuição para a reprodução desta doença de velocidade.

E veja bem. Isso não quer dizer que não devemos nunca acelerar. Às vezes aquele conteúdo mais rápido vai ser necessário em alguma situação que demanda de fato urgência.

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