Pais e filhos transformam Parada LGBT+ em evento de família

22 de junho de 2025 às 11:33
Brasil

O engenheiro Felipe Dias, 41, e o psiquiatra Fábio Carrara, 44, com os gêmeos Miguel e Helena, 2, na Parada do Orgulho LGBT+, em São Paulo - Anna Virginia Balloussier/Folhapress

Folha

Desde 2024, o engenheiro Felipe Dias, 41, e o psiquiatra Fábio Carrara, 44, vão à Parada do Orgulho LGBT+ de São Paulo no pacote família. Nascidos da barriga solidária de uma amiga deles, os gêmeos Miguel e Helena, 2, correm pela avenida Paulista. Perto deles está um homem fantasiado de Ronald McDonald, o palhaço do McDonald’s, enquanto uma turma de corredores atravessa a via, um deles com uma caixa de som tocando "I Will Survive".

Pais e filhos estão com jaquetas combinando, estampadas com as cores do arco-íris.

Este domingo (22) é dia de "honrar o legado de quem veio antes da gente", diz Carrara. "Se eu tava ano passado em família com meu marido, meus filhos aqui, é porque um bocado de gente veio antes de nós e deu a cara a tapa. Muitos morreram, lutaram, foram para o Congresso e adquiriram esse direito por nós."

O tema da Parada em 2025 é "Envelhecer LGBT+: Memória, Resistência e Futuro", o que mexeu com o casal que se conheceu 13 anos atrás, num forró em Belo Horizonte —são o primeiro namorado um do outro.

"O direito de envelhecer veio muito com esse sentimento que tive depois da minha família", afirma Carrara, que acompanha de perto, como psiquiatra, a crise de pacientes LGBTQIA+ com idade avançada.

"A gente tem pouquíssimos serviços para a saúde mental voltados à comunidade, que tem alto índice de suicídio, violência, abandono, solidão."

O medo de envelhecer, diz, é comum entre essa parcela da sociedade. "Já tive pacientes na terceira idade com inúmeras tentativas de suicídio." Muitos conseguiram. "A gente não conseguiu conter esse sofrimento para ajudar, sabe?"

A professora Renata Barbosa, 31, e a coordenadora de logística Daiara Costa, 29, levaram sua bebê Antônia, 11 meses, com uma camiseta onde se lê "forte como a minha mãe".

Estão há 11 anos juntas, depois de se conhecerem "nas baladas da vida". Há três anos, pintou o desejo de serem mães.

Barbosa gestou a criança, que veio por meio de uma fertilização in vitro.

O processo em si foi tranquilo, até rápido. O mesmo não se pode dizer da reação das pessoas à dupla maternidade, inclusive no hospital onde Antônia nasceu.

"Como mãe não gestante, preciso me validar o tempo inteiro", afirma Costa.

Sentiu isso já na maternidade: quando tentou entrar, perguntaram quem era ela. A equipe hospitalar havia colocado o pai de Barbosa como pai da neném que viria à luz. O avô de Antônia.

O empresário Roberto Castro, 57, adotou sua filha Maria em 2019, quando ela tinha quatro anos.

Em frente ao trio que acolhe famílias LGBT+, ele conta que a primeira escola onde pensou em colocar a criança não foi muito receptiva com a ideia de um pai homossexual e solo.

Ele diz que envelhecer na pele paterna o fez ressignificar várias coisas. Antes era "mais desleixado", inclusive arriscando sexo sem proteção. Hoje jamais repetiria algo assim.

"Só por ser gay, as estatísticas já mostram que o sistema de saúde vai ser mais relapso comigo. Ainda tem muito preconceito. Então preciso me cuidar porque eu sou tudo o que Maria tem."

A filha se diverte ao lado com um leque, item que virou símbolo de resistência da comunidade. "São os novos ares", ele brinca sobre o ventinho que Maria produz com o coloridíssimo artefato.